Agronegócio

Reaproveitamento de Resíduos: Resíduos do campo bem aproveitados

O reaproveitamento da água usada na lavagem e na retirada das cascas dos frutos do café transforma resíduo em matéria-prima limpa e despesa em economia nas plantações do Sul de Minas Gerais, que fazem da Cooxupé uma das maiores cooperativas de produção do grão no mundo. A propagação das experiências de obtenção de biogás a partir de dejetos de animais levou ao município de Marechal Cândido Rondon, no interior do Paraná, a iniciativa de implantação dos condomínios de agroenergia do lado de fora das fazendas para atender a agricultura familiar. Nas usinas de açúcar e álcool, toda a sobra representada por bagaço, palha e caldo da cana-de-açúcar retorna ao processo industrial, com ganhos ambiental e financeiro.

Os três exemplos do bem que a tecnologia faz ao campo têm propriedade suficiente, como mostra do avanço do Brasil na recuperação de resíduos do agronegócio. Reflexo do que parece ser uma nova era para o país, dentro dos laboratórios, dos centros de pesquisa e das universidades, há também mais processos prestes a sair do forno para o dia a dia da agroindústria e do comércio. Em Juiz de Fora, na Zona da Mata mineira, o Instituto de Laticínios Cândido Tostes (ILCT) aguarda resposta do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi) para começar a produzir uma bebida láctea acidificada desenvolvida à base de soro de leite.

Subproduto rico em nutrientes, o soro pode constituir grave problema para o meio ambiente em consequência da grande quantidade de matéria orgânica de que é feito, alerta o pesquisador Júnio César Jacinto de Paula, do ILCT, mantido pela Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig). Basta lembrar que o Brasil já ocupa o terceiro lugar como produtor de leite no planeta, com mais de 33 milhões de toneladas anuais produzidas, sem contar a expressiva indústria do queijo, duas verdadeiras máquinas de fabricação do soro. O ILCT estuda as possibilidade de lançar a bebida láctea em diversos sabores e nas versões light e sem lactose, e de transferir o conhecimento para uma empresa do setor.

“O projeto disponibiliza uma alternativa viável para o aproveitamento ecológico racional e sustentável do soro. É uma forma de evitar que ele seja descartado indevidamente em rios e lagoas, provocando diversos danos ambientais”, afirma o pesquisador e especialista em ciência e tecnologia de laticínios.

A tecnologia do biogás desenvolvida no Brasil, por sua vez, deu saltos nas últimas décadas, fazendo com que o país progredisse nas aplicações e nas pesquisas nessa área. Do surgimento dos pequenos biodigestores alimentados por urina e esterco de animais, nos anos 1970, centros nacionais de desenvolvimento como o da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) trabalham, hoje, em projetos para melhoria desses equipametos e no uso de múltiplos resíduos, inclusive aqueles urbanos, em processos de codigestão.

Os estudos foram impulsionados, ainda, pelo interesse das empresas do setor elétrico na energia do biogás, observa Airton Kunz, pesquisador da área de meio ambiente da Embrapa Suínos e Aves. A instituição trabalha em projetos com parcerias da Itaipu Binacional, Eletrosul – Centrais Elétricas e SCGás, Companhia de Gás de Santa Catarina. “Caminhamos para que o país tenha o biogás como um produto, que requer desde o manejo dos subtratos até a purificação. A fazenda é um primeiro elo dessa cadeia”, afirma. A lógica vale para as usinas de açúcar e álcool, que investiram para integrar os resíduos da cana ao processo de produção e à equação financeira das empresas, destaca Jadir Oliveira, gerente ambiental do Sindicato da Indústria do Açúcar e Álcool de Minas Gerais (Siamig). A água e os resíduos são reutilizados dos canaviais ao processamento industrial, gerando economia que alcança 50% quando computadas despesas como adubação.
 

Bagaço de uva ganha função

Programas de incentivo aos pesquisadores dão a sua parcela de contribuição não só para o desenvolvimento de tecnologia de aproveitamento de resíduos agrícolas, como para despertar o interesse na aplicação do trabalho científico no campo e nas cidades. Licenciada em química, Márjore Antunes pôs toda a sua inquietação nos estudos sobre a contaminação da água por metais, numa tese de mestrado que despertou a discussão dos efeitos do uso tão comum dos fármacos. A pergunta inicial foi o que usar para remover o resíduo do diclofenato de sódio, anti-inflamatório com ação analgésica, encontrado na água e nos esgotos. E a resposta foi encontrada nas plantações de uva isabel de Caxias do Sul.

O bagaço da fruta, que já era conhecido como veículo de remoção de metais na água, ganha nova aplicação, mas que requer estudos adicionais, diz Márjore Antunes. “Trouxe a problemática dos fármacos para dentro da universidade. A proposta de uso do bagaço da uva isabel é como um processo adicional nas estações de tratamento de água e esgoto, mas são necessários mais estudos para aumentar a absorção do diclofenato a partir de amostras reais”, afirma. A tese “Utilização do bagaço da uva isabel para a remoção de diclofenato de sódio em meio aquoso”, defendida na Universidade de Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul, recebeu o Prêmio Vale-Capes de Ciência e Sustentabilidade na categoria Aproveitamento, reaproveitamento e reciclagem de resíduos e/ou rejeitos. (MV)

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