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Desordens que podem ocorrer no organismo da vaca leiteira após o parto por nutrição inadequada

Esta baixa de cálcio ocorre quando há aumento súbito da necessidade deste mineral, no período que antecede o parto, para produção de colostro e de leite. Também, no final da gestação, o organismo das vacas pode se tornar incapaz de compensar a perda de cálcio pelo leite; por outro lado, durante a gestação, há deslocamento de cálcio do organismo da mãe para o do feto para o processo de crescimento deste, principalmente no período que antecede o parto.

A tendência para apresentar febre do leite é maior em algumas vacas leiteiras, em função das variações que ocorrem no organismo desses animais no final da gestação, quando eles não conseguem suportar a grande demanda de cálcio, necessária durante este período. Além do mais, ao parto, pode havertambém uma diminuição do cálcio que é absorvido no intestino das vacas leiteiras para ser distribuído pelo corpo. Por isto o problema é mais freqüente em vacas leiteiras de alta produção, uma vez que a demanda de cálcio por essas, supera a capacidade de absorção deste nutriente pelo intestino, em conjunto com o que o corpo retira dos ossos.

No início, as vacas apresentam aumento da sensibilidade e tremor muscular da cabeça e dos membros, evitam andar e não se alimentam. Pode haver agitação e paralisia da cabeça, com ranger de dentes e, posteriormente, ocorre rigidez das patas traseiras. Com isto o animal cai facilmente e permanece deitado.

Se não for tratada, a vaca permanece deitada por longo período, com torcicolo do pescoço para o lado e diminuição do estado de consciência. Com o tempo, desaparece a rigidez das patas, que ficam flácidas e com as extremidades frias. Alterações digestivas como parar de ruminar (remoer) e timpanismo (produção intensa de gases na barriga) são freqüentes. Caso não sejam tratados com medicamentos específicos, estes animais podem morrer.

No estágio final, a vaca permanece deitada de lado, com os músculos flácidos e, em seguida, ocorre a morte por parada da circulação sangüínea (choque circulatório).

A taxa de animais que adoece varia de 3 a 8% em vacas adultas sensíveis, podendo atingir cerca de 30% nas vacas de alto risco. A mortalidade, no caso, pode chegar a mais de 35% dos animais acometidos.

A FL pode trazer prejuízos à produtividade, pois afeta o desempenho animal, podendo reduzir em 14% o leite produzido na lactação, como também diminuir a vida útil do animal em três a quatro anos. Porém, as maiores perdas são relacionadas às complicações associadas à febre do leite, acarretando ainda mais prejuízos do que com a própria enfermidade. Alterações reprodutivas, como expulsão da “madre”, podem ser 3,1 vezes mais freqüentes; partos complicados aumentam em 7,2 vezes sua ocorrência; a retenção de placenta pode aumentar em 5,7 vezes nesses animais e a mastite clínica pode estar em 5,4 vezes mais presente.

Os custos do tratamento com a febre do leite são relativamente baixos e de fácil resolução, porém os maiores prejuízos são em decorrência das complicações citadas acima. Estudos estimam que pode ocorrer uma redução da produção total de leite de uma vaca que teve febre do leite em torno de 5 a 10% e uma redução na vida útil desse animal de até três anos.

O que faz aumentar a ocorrência da febre do leite?

Comdito anteriormente, geralmente a taxa de cálcio no sangue (calcemia) diminui nas proximidades do parto, já que grande quantidade deste mineral é utilizada pela glândula mamária. Isto ocorre, também, em função de o volume de cálcio necessário para a produção de 10 kg de colostro, corresponder a seis vezes a quantidade de cálcio que normalmente circula no organismo da vaca. Portanto, em parte, a gravidade da febre do leite depende da quantidade de colostro secretado e do cálcio disponível para reabsorção óssea e absorção intestinal.

Juntando-se, então, a quantidade de cálcio necessária para a produção de colostro e, posteriormente, de leite, constata-se que no momento do parto a vaca pode utilizar cerca de 30 g de cálcio/dia. Esse valor é nove vezes mais alto que a quantidade de cálcio presente no plasma (parte líquida do sangue) do animal.

A maioria das vacas recupera-se após injeção na veia (endovenosa) de nove gramas de cálcio. Entretanto, alguns animais não respondem ao tratamento. Quando a velocidade da aplicação do cálcio é alta, induz a um excesso dele no sangue, que constitui perigo para o animal. Para evitar este risco, alguns profissionais recomendam a aplicação de uma dose relativamente baixa de cálcio na veia e, uma hora mais tarde, dosagens mais elevadas pela boca.

Aplicação embaixo da pele (subcutânea) também pode ser utilizada para o cálcio. Existem, porém, algumas limitações como a velocidade da absorção, que no caso é baixa. Além disso, essa via (subcutânea) é mais segura em relação aos efeitos indesejáveis do cálcio para o coração, sendo recomendada quando alguma alteração dos batimentos cardíacos for detectada. A aplicação da metade da dose na veia e da outra metade embaixo da pele é também uma prática segura.

O cloreto de cálcio é mais eficiente do que o propionato de cálcio, que por sua vez é mais efetivo que o carbonato de cálcio no aumento do cálcio no sangue.

Injeções de vitamina D sintética (semelhante à vitamina D natural), no músculo ou na veia, em dose de um micrograma por quilo de peso vivo, rapidamente estimulam a absorção intestinal de cálcio e fósforo, bem como a utilização de cálcio presente nos ossos pelo organismo, com conseqüente aumento das concentrações destes minerais no sangue.
Outras desordens que ocorrem após o parto por redução de cálcio no sangue

Independente da produção e da estação do ano, todas as vacas leiteiras, logo após o parto, podem passar por alguma diminuição de cálcio no sangue; portanto, torna-se de grande importância o balanceamento da alimentação dos animais no pré-parto. Este procedimento é indispensável na prevenção não só da FL, mas de outros problemas que podem comprometer a saúde da vaca recém-parida. Esses ocorrem, na maioria das vezes, pelo fato de vacas com febre do leite apresentar maior propensão a outras desordens após o parto, como:

a) Deslocamento do abomaso – compartimento do estômago dos ruminantes que se desloca de sua posição normal para o lado esquerdo do corpo do animal.

b) Retenção de placenta – ocorre quando as membranas que envolvem o feto não se desprendem. Esse distúrbio pode ser conseqüência de vários outros problemas, como doenças infecciosas, principalmente aquelas de ordem reprodutiva, como a “Brucelose”, por exemplo.

c) Cetose – é a baixa de glicose que ocorre em ruminantes, quando eles têm uma grande demanda deste componente durante suas atividades orgânicas e digestivas. É mais freqüente também em vacas de alta produção.

d) Mastites – é a mais comum enfermidade das vacas leiteiras, sendo que em animais susceptíveis e, em condições que favoreçam seu aparecimento, os animais com FL se tornam ainda mais propensos a adquirir essa doença. No caso ocorre principalmente devido ao fato deles permanecerem deitados por longo período.

e) Baixa fertilidade – vacas com FL podem também apresentar reduzida fertilidade pelo prolongamento do anestro (ausência de cio) pós-parto.

f) Síndrome da vaca deitada – quando diagnosticada corretamente e em tempo hábil, a maioria das vacas com FL recupera-se rapidamente, após receber uma única injeção de sais minerais de cálcio. Quando não respondem ao tratamento, podem ocorrer complicações. Assim, as vacas permanecem deitadas, quadro clínico conhecido como “síndrome da vaca deitada”.
Eclampsia

Existe outra enfermidade semelhante à FL chamada eclampsia, a qual está também associada ao aumento da demanda de cálcio no organismo. Porém, observa-se que os animais que apresentam esta deficiência, manifestam seus sinais quando próximo à terceira semana após o parto, no pico da lactação.

O que acontece quando o consumo de cálcio é muito baixo ou elevado?

a) Baixo – normalmente, a vaca deveria receber cálcio suficiente dos alimentos, pois, caso estes possuam níveis excessivamente baixos, a absorção intestinal poderá ser insuficiente. Considerando que a necessidade de cálcio de uma vaca de 500 quilos no pré-parto é de aproximadamente 30 gramas por dia, a manutenção de quantidades satisfatórias de cálcio no sangue vai depender da contínua absorção intestinal do mineral.

Independente do parto pode ocorrer deficiência de cálcio no organismo dos bovinos em preparação para torneios e exposições, quando são alimentados com dietas artificiais contendo cereais ou fenos, que contêm pouco cálcio, e grãos com alto teor de fósforo.

b) Alto – fornecimento de alimentação muito rica em cálcio no pré-parto pode favorecer o aparecimento da FL, uma vez que a ingestão excessiva do cálcio pode alterar a forma correta deste mineral ser utilizado no organismo. Animais consumindo mais de 100 gramas de cálcio por dia apresentam elevado nível de cálcio no sangue, porém, são incapazes de manter estes níveis próximos ao período crítico do parto. Em outras palavras, o organismo do animal estaria adaptado a aproveitar o cálcio “mais disponível”, vindo da alimentação e, no momento crítico do parto, estaria “despreparado” tanto para absorver “mais ativamente” o mineral no intestino, como para aproveitá-lo das reservas existentes no próprio corpo (ossos).
A importância do consumo adequado de minerais

A excessiva ingestão de fósforo na alimentação pode alterar a taxa de cálcio em relação ao fósforo. Este excesso de fósforo é um dos fatores que mais favorece o aparecimento da FL e da eclampsia. Isto ocorre porque altas taxas de fósforo no sangue do animal, indiretamente, diminuem a absorção do cálcio no intestino. Tem que haver uma proporção equilibrada entre esses dois minerais.

Porém, no Brasil, muitas vezes, os bovinos criados sob pastejo não recebem minerais em quantidade e taxa suficientes para atender sua mantença e sua produção. Isto faz com que os animais dependam exclusivamente da pastagem para fornecer estes elementos minerais, uma vez que as concentrações de minerais nas plantas forrageiras são variáveis, pois dependem do tipo da planta, da época do ano, da quantidade do mineral no solo, do tipo de solo e de suas condições (por exemplo, acidez e umidade).

Alguns fatores que favorecem o aparecimento destas desordens

a) Vacas velhas – vacas com idade entre cinco e dez anos são mais propensas a desenvolver a FL e a eclampsia, tanto por possuírem menor capacidade de utilizarem o cálcio dos ossos, como por ocorrer menor absorção de cálcio intestinal nessa faixa de idade. A doença aparece mais em vacas que estão entre a terceira e a sétima parição.

b) Alta produção de leite, tipo e raça do animal – raças de corte, por produzirem menor volume de leite, são menos acometidas pela FL. Há diferenças também entre raças leiteiras. As vacas Jersey, mesmo produzindo menores volumes totais de leite que as Holandesas, são mais afetadas pela FL.

c) Ocorrência em uma lactação aumenta a possibilidade de repetir (reincidência) a enfermidade – vacas que tiveram febre do leite em uma lactação anterior apresentam chance duas a cinco vezes maior de desenvolver a doença do que as outras vacas do rebanho.   

Prevenção – A deficiência de cálcio é uma enfermidade esporádica mais comum em grupos específicos de animais do que em determinadas regiões geográficas.  Esta entre várias outras é considerada uma doença da produção, doenças essas que se destacam cada vez mais entre os problemas que afetam a atividade leiteira. No caso, a enfermidade ocorre, principalmente, em rebanhos de alta produção, quando os animais estão no periparto (período de 48 horas antes a 48 horas após o parto), quando há maior demanda e aumento da velocidade de circulação de minerais e líquidos no organismo da vaca, causando assim um desequilíbrio e, conseqüentemente, instalação da doença no animal.

Fatores individuais e manejos nutricionais inadequados no pré-parto são as causas primárias da febre do leite e que, além de trazer prejuízos, acarretam uma série de complicações como dificuldade de parir, mastite, prolapso do útero (exposição da “madre”) e outros como a redução da produção de leite e o descarte de vacas antes do tempo.

A aplicação de cálcio em quantidades suficientes imediatamente após o parto, quando o declínio deste mineral acontece nas vacas, é uma medida básica para impedir que os animais adoeçam. Há a recomendação de 2,7 a 3,4 gramas de cálcio por quilo de leite produzido, principalmente nos dois primeiros meses de lactação.

Trabalhos experimentais mostraram que quantidades de alimento com um máximo de 45 gramas de cálcio por vaca por dia no pré-parto e proporções de cálcio para fósforo de um para um, ou menos, reduziu a febre do leite de 7 a 16% para 3 a 4% em vacas com produção de 5.500 quilos por lactação. Por esta razão dietas com níveis de cálcio adequados no pré-parto são recomendadas.

A vitamina D também tem sido utilizada como uma medida de prevenção da FL em bovinos:
a) aplicação oral (pela boca) de 20 milhões de unidades de vitamina D2 por dia, durante cinco dias, antes do parto, reduziu acentuadamente a febre do leite e

b) uma dose única de 10 milhões de unidades de vitaminas D3 aplicada intramuscular (no músculo), dois a oito dias antes do parto, também se mostrou bastante eficiente na redução da ocorrência desta enfermidade.

Alguns cuidados, porém, devem ser observados quando da administração da vitamina D3 ativa, pois há perigo de ocorrer complicações em animais que recebem altas doses de vitamina D. A presença de um profissional da área é aconselhável na realização da prevenção e do tratamento acima citados.

A vaca leiteira, em virtude do rápido crescimento fetal no pré-parto, apresenta equilíbrio muito instável nas taxas de minerais circulantes, sendo provocado também pela alta demanda de nutrientes ou da produção de grande quantidade de leite, que coincide, geralmente, com a diminuição do apetite que ocorre no pós-parto.

Os relatos referentes às enfermidades pós-parto no Brasil não são muitos, possivelmente pelo baixo índice de produção de nossas vacas. No entanto, recomenda-se efetuar um manejo diferenciado nas vacas e nos rebanhos leiteiros de maior produção, porque são mais sensíveis à ocorrência de febre do leite e das outras enfermidades mais comuns neste período.  

Conclui-se que para prevenção dessas doenças, deve-se manejar de forma racional uma propriedade leiteira, com especial atenção para àquelas de alta produção. Isto se refere, sobretudo, ao manejo nutricional no pré-parto e no pós-parto, reduzindo assim a ocorrência de febre do leite, dos outros distúrbios a ela associados, além de outras enfermidades comuns neste período.

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