Agricultura

Caracterização do quadro atual e principais ameaças à produção de coco seco no Nordeste do Brasil

          

A cultura do coqueiro da variedade gigante do Brasil, notabilizou-se ao longo dos anos, como cultura geradora de renda, responsável pela sobrevivência principalmente de pequenos produtores ao longo da faixa litorânea do Nordeste.

Em função do seu ciclo contínuo de produção, e da sua capacidade de adaptação aos solos arenosos e aos déficits hídricos estacionais característicos desta região, a cultura do coqueiro da variedade gigante, destacou-se  pela sua capacidade de produção em condições adversas onde nenhuma outra cultura consegue lhe fazer concorrência.

Introduzido no Brasil pelos portugueses nos idos de 1553, o coqueiro gigante é o principal responsável pela produção do “coco seco”, comercializado no mercado “in natura” como forte componente da culinária regional, sendo utilizado também pela indústria de alimentos na produção do coco ralado de onde se obtém o leite de coco e outros derivados.

Durante o período de maior escassez de matéria prima, e a depender do preço do “coco verde” praticado no mercado de água de coco, observa-se um deslocamento da produção de frutos originários de coqueiros da variedade anão para utilização como coco seco, apesar do seu menor rendimento industrial em relação ao fruto do coqueiro gigante.

O coco  obtido de híbridos intervarietais, é normalmente utilizado pelas agroindústrias, que dispõem de plantios próprios, normalmente realizados em condições de clima e solo mais favoráveis que se caracterizam pela utilização de sistemas semi intensivos de produção.

Historicamente, a produção de coco seco no Brasil, apresentou oscilações ao longo dos anos, atribuído entre outros fatores, à flutuação dos índices pluviométricos anuais, como também à variação do preço deste produto, que neste caso, condiciona os investimentos em adubação e tratos culturais utilizados, com reflexos diretos sobre a produção de frutos nos anos subseqüentes.

Entre o final das décadas de 1990 e início de 2000, o mercado de coco seco no Brasil, apresentou grande variabilidade determinada pelas importações do coco ralado, as quais se aproximaram do consumo aparente brasileiro.

Com o término a partir de 2012 das medidas de salvaguardas impostas pelo governo federal, que estabeleceram cotas de importação do coco ralado desde a sua implantação em 2002, espera-se uma reativação das importações deste produto, tendo em vista que apresentam preços infinitamente inferiores ao similar  nacional. Esta situação poderá trazer conseqüências desastrosas para os produtores nacionais que não se prepararam adequadamente para enfrentar este novo desafio.

De maneira geral, os atuais plantios encontram-se em sua maioria abandonados, com produtores desestimulados, em função não somente dos baixos preços do coco seco, como também, da falta de políticas governamentais de incentivo à cultura. Este quadro se caracteriza pela não adoção de práticas de manejo cultural e fitossanitário, que se refletem na queda de produção e na qualidade dos frutos colhidos. Em grande parte das situações, observa-se que seria inviável a implantação de um programa de recuperação dos atuais plantios, considerando-se o grau de comprometimento em relação ao estado nutricional e condições gerais das plantas.

Entre os problemas fitossanitários encontrados, merece destaque a alta incidência das doenças foliares conhecidas como “queima das folhas” e “lixas” que reduzem significativamente o número de folhas vivas provocando queda acentuada de produção, principalmente nas áreas mais afastadas do litoral. Deve-se registrar ainda, a rápida expansão da doença “Resinose do coqueiro”, que tem provocado mais recentemente, elevada mortalidade de plantas, quando medidas de controle não são adotadas em sua fase inicial.

A ocorrência desta doença tem sido associada inclusive, ao aumento significativo de pragas dentro do coqueiral, com destaque para as coleobrocas.  São expressivas também, as perdas ocasionadas pelo “ácaro da necrose”, responsável pela acentuada queda de frutos jovens e pelos danos causados aos frutos colhidos. Neste caso específico, o método de controle preconizado em que se utiliza pulverização à base óleo de algodão e detergente neutro enfrenta dificuldades operacionais para sua execução, tendo em vista a necessidade de utilização de implemento agrícola apropriado, considerando-se a altura da copa da maioria dos coqueiros e a irregularidade observada nos sistemas de plantio.

No que se refere ao manejo cultural, observa-se a realização eventual de gradagens do solo e roçagens da vegetação natural nas entrelinhas, sem uma definição da melhor época ou mesmo sobre a necessidade de sua realização. O coroamento das plantas, quando realizado, é normalmente feito com enxada, abrangendo aproximadamente 1,5 m de raio do tronco do coqueiro. Observa-se também, a utilização das entrelinhas para pastejo da vegetação natural com bovinos e alguns casos ovinos, ou mesmo introduzindo-se gramíneas do gênero Brachiária, elevando-se neste caso, a competição por água e nutrientes com os coqueiros.

Embora a região produtora de coco se caracterize pela ocorrência de déficit hídrico em grande parte do ano, não se verifica uma preocupação do produtor no sentido de conservar a umidade do solo. As cascas de coco ou mesmo as folhas mortas que poderiam ser utilizadas como cobertura morta na zona de coroamento do coqueiro, são geralmente queimadas. Com relação à consorciação com outras culturas, verifica-se que a área plantada ocupa um pequeno percentual da propriedade, utilizada em sua maioria como cultura de subsistência.

Embora considerada de fundamental importância para aumentar a produção de frutos, a adubação dos coqueiros é realizada esporadicamente, sem que sejam observadas fontes de nutrientes e dosagens mais adequadas, épocas e formas de aplicação. Considerando-se que seu efeito somente é observado a partir do segundo e/ou terceiro ano após a primeira aplicação, é necessário que esta prática seja adotada de forma contínua ao longo dos anos, situação esta muitas vezes inviabilizada pelo baixo preço do coco e elevados custos dos fertilizantes. A grande dificuldade observada neste caso, é que com o aumento da produção, elevam-se também as perdas decorrentes da queda de frutos imaturos provocados pelo ataque de ácaros.

Em se tratando de uma cultura de grande importância sócio econômica para a região Nordeste, é possível que pequenos plantios com coqueiros da variedade gigante continuem a ser realizados em substituição aos atuais, como também sejam mantidas áreas sem a realização de maiores investimentos, com forte tendência de redução de produção ao longo dos anos.

Com o crescimento das importações, a produção nacional de coco deverá ocupar possivelmente nichos de mercado, onde se utiliza preferencialmente o produto “in natura”, restringindo ainda mais  a produção nacional. Torna-se necessário assim, que medidas urgentes venham a ser tomadas por parte do setor público, no sentido de incentivar a exploração do coqueiro, priorizando a renovação destas áreas, com ênfase na utilização de sistemas integrados de produção. Há necessidade também, de implantação de uma política de agregação de valor ao coco, através da instalação de pequenas unidades processadoras, que permitam, por exemplo, a produção do coco ralado e de outros produtos como óleo de coco, como também o aproveitamento dos seus co-produtos a partir da fibra produzida.

Se nada for feito, teremos que nos acostumar com as belas imagens dos nosso coqueiral apenas como formador da paisagem cênica do nosso litoral, sendo preservado apenas em resorts e condomínios, ou restringindo-se a pequenos plantios, esquecendo-se a sua função social como cultura geradora de renda, que permitiu ao longo dos anos a sobrevivência de pequenos produtores da região litorânea do Nordeste.

Autor:
Humberto Rollemberg Fontes é especialista em fitotecnia e pesquisador da Embrapa Tabuleiros Costeiros, Aracaju-SE

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