O javali consta na lista das 100 piores espécies exóticas invasoras do mundo e provoca graves problemas econômicos, sociais e ambientais em vários países onde foi introduzido, segundo o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Na parte ambiental, ele pode matar diversas espécies nativas da flora, provocar a diminuição da diversidade de plantas, eliminar espécies de invertebrados, se alimentar de ovos e filhotes de animais nativos e transmitir doenças para os animais da região. O javali também pode causar impactos sociais e econômicos por meio do ataque aos seres humanos, aos animais domésticos, destruição de plantações em áreas agrícolas e transmissão de doenças para homens, bovinos, suínos, seus cães, gatos e outros bichos de estimação.
O ataque do javali ao lavrador João Batista de Araújo, de 40 anos, na cidade de Ibiá, no Alto Paranaíba, ainda deixa o produtor rural Camilo José de Paiva revoltado. “Perdi um funcionário e um amigo. Me faz falta até hoje. Não achei um para substituir”, afirma Paiva. O seu funcionário foi morto em 2010, em emboscada com o javali. “Meu trabalhador foi olhar o gado, no terreno que anteriormente era uma lavoura. Tinha alguns cachorros com ele, mas o javali deu o atingiu com o focinho, que foi fatal. É um animal selvagem, muito arredio, com índole agressiva”, afirma Paiva. Depois do ataque, o javali foi morto pelos moradores da região. “Mas outros continuam destruindo lavouras e trazendo prejuízo. Em algumas fazendas do município, espigas de milho são derrubadas pelos animais e vários clarões são vistos nas plantações”, diz Paiva.
O produtor João Ernandes Alves tem uma chácara na cidade de Ibiá, no limite com Pratinha. Na Fazenda Caiuá, ele planta batata, milho e feijão em 90 hectares. Alves conta que já tentou de tudo para combater os javalis, sem sucesso. “Nem a cerca elétrica eles respeitam e ainda avançam na gente. Há cerca de 200 javalis na minha fazenda. E a cultura mais prejudicada é a do milho. Eles derrubam tudo e comem”, conta Alves. Segundo ele, cerca de oito hectares de milho já foram jogados no chão. “Já fiz uns buracos (armadilhas) para ver se eles caem, mas não peguei nenhum até agora. A instrução do Ibama precisa ser implantada urgentemente. Caso contrário, vamos ter que parar de plantar. A reprodução dos javalis é muito rápida. E os filhotinhos, com quatro meses, já estão comendo tudo”, diz Alves.
Luz para salvar os milharais
A cultura do milho é a mais afetada nas fazendas pelo ataque dos javalis. “Já no plantio eles reviram o adubo em busca de semente. Depois comem a espiga. Há cerca de cinco anos eles atacam as lavouras. A cada ano aumenta a dimensão do estrago”, afirma Hermógenes Vicente Ribeiro, presidente do Sindicato dos Produtores Rurais de Sacramento, no Alto Paranaíba. Há prejuízo, diz, para produção e meio ambiente, além de risco de doença para outros animais. “Eles destroem as nascentes preservadas e reviram para comer as raízes de algumas plantas. Não dá para capturar, pois são muito ariscos. Com a instrução, temos agora uma luz para ver qual caminho seguir”, diz Ribeiro.
O presidente do Sindicato Rural de Araxá, Alberto Adhemar do Valle Júnior, recebe com frequência reclamações de produtores sobre ataques de javalis nas plantações. “As culturas de milho estão sendo as mais prejudicadas. O javali é um animal exótico. Não temos controle sobre sua população, cada vez maior. Eu não sou a favor de matar bicho nenhum, mas também não posso defender que o produtor tenha prejuízo”, observa Júnior.
Depois de mais de 50 anos no cultivo de milho, o produtor João Rezende de Lima abandonou a cultura em função dos ataques de javalis. Ele chegou a ter de 50 a 60 hectares de milho em Araxá. Hoje não tem mais nenhum. Só cultiva batata e gado de corte. “Já fui atacado mais de 10 vezes por javali. A saída foi colocar cachorros para proteger”, diz.
O produtor José Zambianco já perdeu 5 mil sacas de milho por ano com os ataques de javalis. “Eu tenho prejuízo desde o plantio até o momento em que as espigas nascem. Em algumas, eles só abrem a palha e comem o grão. Aí chove e as mesmas apodrecem”, conta. A espiga podre, diz, tira a qualidade do grão bom. “A colheitadeira pega o milho e eu acabo sofrendo o desconto por ter entregado material podre”, afirma.
O engenheiro-agrônomo Rafael Salerno alerta que as doenças causadas pelo javali podem afetar o comércio exterior e expor o rebanho brasileiro a uma crise sanitária, caso seja mantida a população do animal em vida livre. “Há casos de produtores que perderam tudo, inclusive bois e vacas premiados. A taxa de reprodução dos javalis é muito alta. O crescimento da população deles no campo é espantoso”, afirma Salerno. Ele revela que a instrução do Ibama traz segurança jurídica para o agricultor e os gestores de unidade de conservação fazerem o controle do javali. “O problema ambiental é sério”, conclui o engenheiro, que já presenciou a infestação dos bichos em Fortuna de Minas, na Região Central do estado. Os javalis também estão cruzando com porcas e os filhotes, javaporcos, também estão se proliferando. (GC)
MÉTODOS DE CONTROLE DOS JAVALIS
Os mais comuns (não precisam de autorização)
» Espera em girau ou apostadero: monta-se uma tocaia em uma plataforma suspensa ou torre próxima a uma ceva.
» Busca com binóculos: a área é percorrida a cavalo e a pessoa utiliza binóculos para observar o local.
» Perseguição a cavalo com cães: cães são treinados e cada um tem uma função.
» Aproximação: o animal é localizado, a pessoa se aproxima e surpreende o animal.
» Espera: é realizada a partir de um local alto estrategicamente colocado a longa distância dos pontos de alimentação ou passagem costumeiros dos animais.
» Encontro: é composta de um caçador e vários batedores. O caçador se posiciona próximo a trilhas onde a caça passa regularmente e os batedores vasculham e cercam a área fazendo com que o javali se desloque em direção ao caçador.
Métodos que precisariam de autorização
» Armadilha com cevas: armadilha com cerca com acesso liberado e com ceva (milho, abóbora, mandioca etc.). Depois de visitas frequentes, a armadilha é acionada. As armadilhas podem ser tipo gaiola, funil, labirinto etc.
» Armadilhas com porcas no cio: a armadilha contém uma porca induzida ao cio que deve ficar isolada em uma jaula de ferro. Geralmente, as armadilhas só permitem a entrada dos animais e pode ser tipo funil, labirinto etc.
» Substância química: não é permitida a utilização de veneno, de acordo com o artigo 10 da Lei 5.197, de 3 de janeiro de 1967. Outras substâncias poderão ser avaliadas.
» Captura, marcação, soltura e rastreamento: o método consiste em capturar o animal, principalmente fêmeas, por meio de armadilha ou dardo com anestésico, marcar com rádio/GPS colar e soltar. Posteriormente, esse animal é rastreado, todo o bando é localizado e pode ser abatido, aumentando a eficiência.
» Batida: a modalidade mais usada para caçar animais de forma geral no mundo, embora não seja a mais usada para javalis no Brasil. Várias pessoas se posicionam em linha por algum trilho ou estrada interna ou em volta de determinada área, nas partes mais altas do terreno com vistas para cursos d”água, vales, passagens frequentadas. O javali é acuado por matilhas de cães treinados e os atiradores abatem os animais.