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A raça pé-duro: Origem, Aspectos Históricos e Potencial Econômico

A raça pé-duro é descendente dos bovinos trazidos pelos portugueses no período colonial. No Nordeste, os dois principais portos de entrada de bovinos naquele período foram os de Salvador, na Bahia, e o de Olinda, em Pernambuco.

Como a Zona da Mata, próxima ao litoral e mais chuvosa, era destinada à produção de açúcar para exportação, os criadores de bovinos tiveram que se embrenhar pelo sertão semi-árido à procura de pastagens para seus animais. Seguiram o curso do rio São Francisco e de seus afluentes para estabelecer suas fazendas. E estas cresceram em número e prosperidade, tanto que o São Francisco foi cognominado “rio dos currais”. A famosa Casa da Torre, com sede na Bahia, e o mais importante estabelecimento de criação, alcançou, no Nordeste, uma área superior a muitos países.

Indo além do São Francisco e de seus afluentes, os criadores atingiram o rio Parnaíba, no Piauí, e ultrapassaram-no, chegando ao Maranhão. Há também registros históricos de que animais de criação foram enviados do Maranhão ao Pará. Os bovinos do Nordeste também chegaram a Minas Gerais e ao Brasil Central. O Vale do São Francisco é o berço principal da raça pé-duro e seu grande centro de irradiação. A bacia hidrográfica do rio Parnaíba, incluindo o estado do Piauí, também teve uma grande importância na expansão desta raça.

Os bovinos descendentes daqueles trazidos de Portugal, submetidos a uma seleção natural rigorosa, foram, aos poucos, adaptando-se a condições de pastagens de baixa qualidade, de seca e de calor, além de ataques de parasitas e de doenças, resultando, depois de séculos, em animais de extraordinária rusticidade e adaptados a essas severas condições. Assim originou-se a raça pé-duro.

A raça pé-duro possui também outras qualidades: é dócil, sua carne é saborosa, o couro macio e resistente e o leite excelente. Segundo alguns criadores e técnicos é também muito menos susceptível a plantas tóxicas como o barbatimão (Stryphnodendron coriaceum) e a erva-de-rato (Palicouria marcgravii).
O Piauí chegou a possuir o maior rebanho bovino do País, tornando-se um grande exportador de carne para outras regiões brasileiras e de couro para a Europa. Simplício Dias, um notável empreendedor do século XVIII, na cidade de Parnaíba, PI, abatia cerca de 30 mil bois por ano e possuía uma frota própria de navios para transportar seus produtos. E o gado pé-duro era a base dessa pecuária. Não é de admirar, portanto, a importância que esta raça tem na história, economia, tradição e folclore do Piauí e de outros estados.

Com a expansão do zebu no Brasil, a partir do início do século XX, seus cruzamentos com o gado pé-duro e outras raças regionais resultaram em animais com notáveis características zootécnicas. Infelizmente, como a grande maioria dos criadores tinha escassos ou nulos conhecimentos de Genética, essa melhoria resultante dos cruzamentos foi atribuída apenas à presença do zebu. E, assim, os cruzamentos absorventes foram empregados indiscriminadamente, quase extinguindo este notável recurso genético que é a raça pé-duro.

Então, mais uma vez, o Piauí deu uma importante contribuição para a existência desta raça. Em 1983, a atual Embrapa Meio-Norte, com sede em Teresina, implantou em São João do Piauí, PI, na zona semi-árida, o Núcleo de Conservação da Raça Pé-Duro. Nesse núcleo, os animais são mantidos em condições o mais próximo possível daquelas em que a raça se formou, com o objetivo de manter sua rusticidade. Seu rebanho atual é de cerca de 300 cabeças. Esse núcleo vem cumprindo seu papel, apesar das grandes dificuldades enfrentadas. Animais ou sêmen oriundos direta ou indiretamente desse rebanho já foram utilizados nas seguintes Unidades da Federação: BA, CE, DF, GO, MA, MG, PA, PB, PI e TO.
Além de seu extraordinário valor como recurso genético, utilizável para atender demandas futuras, que não podem ser previstas hoje, o gado pé-duro pode ter importância atual, seguindo-se as seguintes estratégias:

a) Criação como raça pura, procurando-se manter sua rusticidade e selecionando-se os animais para um maior porte e as vacas para uma razoável produção de leite, para atender o consumo das famílias dos pequenos pecuaristas;

b) Cruzamentos com raças zebuínas, tais como a guzerá, a sindi, a gir, a nelore e a indubrasil, visando obter animais de maior peso, adaptados a pastagens naturais, principalmente aos diversos tipos de caatinga, e com bons índices reprodutivos;

c) Cruzamentos com raças leiteiras como a jérsei, a holandesa, a parda suíça, a guernsey, etc., para a obtenção de vacas resistentes ao calor e a uma alimentação de menor qualidade.

Nesses cruzamentos, o gado pé-duro será utilizado apenas como raça paterna, enquanto o número de vacas desta raça não atingir um número adequado. E, quando o número de vacas for suficiente, é necessário evitar-se uma grande desproporção entre o tamanho dos touros e das vacas.

Deve-se salientar que animais produtivos e bem adaptados podem resultar de cruzamentos. A raça ovina santa inês, atualmente a mais fomentada no Nordeste, é produto de cruzamentos não controlados entre raça exótica (possivelmente a bergamasca) e nossas raças crioulas, com predominância da morada nova. E diversos resultados promissores foram obtidos por criadores em cruzamentos de pé-duro com nelore, gir, holandesa e jérsei, o que abre um vasto campo para experimentação nessa área.

É interessante frisar que, somente no Nordeste Brasileiro, existem cerca de 154 milhões de hectares de terras do grupo 5 de aptidão agrícola, ou seja, 31% do território regional, segundo levantamento do Ministério da Agricultura (1979). Essas terras do grupo 5, quando manejadas com baixo ou médio nível tecnológico, só devem ser utilizadas para silvicultura, pastagem natural ou para preservação ambiental, não sendo recomendável sua ocupação com lavouras ou pastagens cultivadas. A criação do gado pé-duro e de seus mestiços, pela sua resistência e adaptação, é uma das maneiras de utilizar essas terras de forma sustentável.

Características
O Pé-Duro é um bovino dócil, rústico e resistente, adaptado ao clima tropical, ao calor, à seca, às pastagens naturais do Nordeste, notadamente ao Semi-Árido com sua vegetação de caatinga.

É tolerante a temperaturas elevadas, a parasitas, e possivelmente a algumas plantas tóxicas da região, como o barbatimão (Stryphnodendron coriaceum) e à erva-de-rato (Palicourea marc gravii).

É prolífico e longevo. Bem alimentado, mostrou-se também precoce e de boa conformação de carcaça para corte. Tem ótima habilidade materna. Há alguns exemplares que mostram boa produção leiteira sem complementação com ração.

Apresenta uma grande variedade de cores de pelagens, predominando a vermelha e a amarelada em vários tons. Os machos costumam extremidades mais escuras, inclusive nos testículos. As pelagens pretas, fusca e raposa não são raras.

É comum a ocorrencia de manchas escuras ao redor dos olhos – os "óculos".

Suas orelhas são pequenas e arredondadas nas extremidades, barbela pouco desenvolvida, barguilha curta e rente à barriga e com poucos pélos; anteriores mais curtos que os posteriores, musculatura bem desenvolvida no pescoço dos machos. As mucosas são geralmente escuras.

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