Há uma pergunta que frequentemente os produtores de leite se fazem: “Não mudamos nada na fazenda e a produção de leite caiu. O que aconteceu?” Alguns dos fatores que podem explicar este fenômeno são:
Mais vacas parindo
DEL aumentando
Mudança de estação
Mudança de funcionário na fazenda
Mudança na qualidade dos ingredientes da dieta.
De todas as opções, a última apresentada é a mais difícil de ser diagnosticada e é a que ocorre com mais frequência. Para deixar claro este ponto, observe a figura 1, que contêm dados de duas fazendas americanas que foram acompanhadas diariamente. Pesquisadores coletaram amostras do silo de milho e analisaram a forragem em relação à matéria seca, proteína bruta e fibra em detergente neutro (FDN). Veja que, em duas semanas, houve uma variação de aproximadamente 10% em todos os nutrientes (água, proteína e fibra). Ou seja, a pesquisa mostra que não se pode dizer que “minha silagem está boa este ano” e sim “esta semana minha silagem está boa”.
Figura 1 – Variação diária na qualidade de silagem de milho. DM = matéria seca, NDF = fibra em detergente neutro e starch = amido
Mas esta variação ocorre somente em alimentos ensilados? Não. A tabela 1 mostra também a variação do milho grão. Observe novamente a enorme variação. A matéria seca do milho grão alterou-se de 83% para 86,5%. Isto significa que ele secou neste período e que poderia ter sido utilizado menos milho para produzir a mesma quantidade de leite.
Tabela 1 – Variação na composição da silagem de milho durante 12 meses em fazendas americanas
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Mín |
Max |
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Silagem de milho |
|
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MS |
29,9 |
43,1 |
FDN, %MS |
35,1 |
51,2 |
PB, %MS |
6,8 |
11,8 |
|
|
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Milho grão |
|
|
MS |
83 |
86,5 |
FDN, %MS |
9,9 |
13,3 |
PB, %MS |
7,8 |
9,2 |
|
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Milho grão úmido |
|
|
MS |
57,3 |
77,6 |
FDN, %MS |
7,9 |
23,6 |
PB, %MS |
6,9 |
9,1
|
Silagem de milho dados de 48 fazendas
Milho grãos: dados de 27 fazendas
Milho grão úmido: dados de 23 fazendas
A mesma ideia se aplica ao milho grão úmido, que passou de 7,9% para 23,6% de FDN na MS. Se a dieta não for modificada para levar estes valores em consideração, o animal passa a receber uma dieta totalmente desbalanceada, o que certamente explica variações na produção de leite. Ou seja, nem mesmo o milho pode ser considerado um alimento homogêneo. Na indústria de aves e suínos é muito comum os nutricionistas enviarem, frequentemente, amostras de milho para análise no laboratório, pois uma variação pequena pode resultar em perdas ou ganhos enormes.
Na simulação a seguir, uma dieta para um lote de 30 kg de leite com peso de 600 kg e dias em lactação (DEL) de 150 dias (tabela 2), a dieta fornecida continha feno, silagem de milho, milho moído, farelo de soja e caroço de algodão. A ideia foi simular a mudança da qualidade da silagem de milho em:
-estimativa de produção de leite (EM ou PM)
-CNF = carboidratos não fibrosos
-Retorno sobre lucro alimentar = quanto o produtor ganha por vaca pagando somente o custo alimentar.
Tabela 2 – Impacto da variação da qualidade na silagem de milho na produção de leite das vacas da fazenda. Dietas A (silagem de milho com 40% de FDN), dieta B (silagem de milho com 45% de FDN) e dieta C (silagem de milho com 50% de FDN).
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A |
B |
C |
Kg MS |
FDN |
FDN |
FDN |
|
40% |
45% |
50% |
Feno |
2 |
2 |
2 |
Silagem de milho |
10 |
10 |
10 |
Milho moido |
5 |
5 |
5 |
Farelo de soja |
3,5 |
3,5 |
3,5 |
Caroço de algodão |
2 |
2 |
2 |
|
|
|
|
CNF |
41,77 |
39,55 |
37,34 |
EM disponível para leite, kg/d |
32,19 |
30,92 |
29,63 |
PM disponível para leite, kg/d |
33,36 |
31,86 |
30,39 |
RSCA |
18,15 |
16,87 |
15,59 |
CNF = Carboidratos não fibrosos.
EM = energia metabolizável
PM = proteína metabolizável
RSCA = quanto o produtor ganha por vaca pagando somente o custo alimentar
A primeira observação é que a estimativa de produção de leite vai caindo conforme a qualidade da silagem de milho vai piorando. Na dieta A, a estimativa de produção foi de 32,19 kg de leite/dia, na dieta B 30,92 e na dieta C 29,63 kg. Ou seja, em uma semana, é possível observar uma diferença na produção de aproximadamente 2,5 kg/vaca/dia somente devido a mudança na qualidade da forragem. Em uma fazenda de 100 vacas, isso representa 250 kilos de leite a menos!
Outro ponto importante é o desbalanceamento que a mudança da qualidade de um ingrediente causa na dieta. A dieta C estava balanceada com 37,34% de CNF, ou seja, um valor seguro para trabalhar. Já a dieta A, estava com 41,77% de CNF, um valor mais perigoso e muito capaz de causar acidose subclínica no rebanho.
Certamente, a variável que mais preocupa o produtor é quantos reais (R$) a vaca está dando de lucro, levando em consideração somente o custo alimentar dela. Fica claro novamente que quanto melhor a qualidade da forragem (dieta A), mais dinheiro a vaca será capaz de deixar na fazenda. Em números, a dieta A deixa R$18,15/vaca/dia enquanto a dieta C deixa R$15,59/vaca/dia. Uma diferença de R$2,50/vaca/dia que passa despercebido na fazenda.
