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Café ralo, apesar da recuperação – Preço maior, colheita menor – Reflexos na próxima safra

Preço maior, colheita menor

Aumento do valor da saca de café de 60 quilos chega a 93%, mas a maioria dos produtores não vai lucrar com a cotação. A seca representa fortes perdas nas lavouras e muitos já negociaram a safra

Ralph Junqueira colhe café em Carmo de Minas: dor no coração ao observar que os grãos não desenvolveram como planejado  (Felipe Christ/Divulgação)

Ralph Junqueira colhe café em Carmo de Minas: dor no coração ao observar que os grãos não desenvolveram como planejado

A estiagem que castiga o campo queimou boa parte das lavouras de café, principal commodity do agronegócio mineiro, e o preço do grão pago ao produtor praticamente dobrou. A saca de 60 quilos, que custava R$ 220 há dois meses, agora é vendida em torno de R$ 425 – diferença de 93%. Nem toda a colheita, porém, será vendida por essa cifra, pois muitos cafeicultores, como é de praxe no campo, já negociaram boa parte da produção pelo valor antigo para honrar compromissos financeiros, seja com adubos ou com a mão de obra.

Até 7 de fevereiro, segundo pesquisa da Safras & Mercado, empresa de consultoria em agronegócio, 71% da safra estadual 2013/2014 já havia sido negociada. “Negociei cerca de 70% da safra antes da colheita”, conta Carlos Alexandre Miranda Botrel, produtor em Três Pontas, no Sul de Minas. Há outro problema: boa parte dos fazendeiros perdeu um percentual grande da lavoura em razão da estiagem. Ralph Junqueira, cafeicultor em Carmo de Minas, também no Sul do estado, planejava colher 2,5 mil sacas este ano, mas deve retirar da lavoura em torno de 1,5 mil sacas.

“Apesar da alta do preço, essa diferença (93%) não compensou a perda que tivemos com a lavoura”, disse o produtor. O atual preço, apesar do expressivo aumento em relação ao negociado no início deste ano, ainda está abaixo do apurado em 2011, quando a saca chegou a valer R$ 550. “E é bom lembrar que, de lá para cá, houve inflação”, lamentou Ralph. Apenas para recordar, a inflação oficial do Brasil, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) e calculada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ficou em 6,5% em 2011, em 5,84% em 2012 e, em 2013, 5,91%.

Já a possibilidade de o preço da saca continuar subindo dependerá de São Pedro, como explica Breno Mesquita, presidente das comissões de café da Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) e da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Minas Gerais (Faemg).

“É muito difícil prever se o preço continuará subindo, pois vai depender de São Pedro. A maioria dos produtores teve de vender o produto (pelo preço antigo) para acertar compromissos. Esses não se beneficiaram do aumento. Ainda é prematuro mensurar o percentual de perda, porque o período de seca não terminou. Há uma perda, mas qual será só saberemos quando terminar a colheita. O que temos recebido de informações de cafeicultores da Zona da Mata mineira, do Sul do estado e do Triângulo Mineiro é preocupante.”, diz Mesquita.

GRÃOS CHOCOS Mas o percentual de perda pode ser alto. Para se ter ideia, estudo da Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig) em cafezais no estado revelou problemas de qualidade com até 45% de grãos chochos em algumas propriedades do Sul de Minas. Tal índice foi apurado numa fazenda em Três Pontas, uma das cidades que mais produz o grão no país. Carlos Alexandre, o produtor que vendeu 70% da safra antes da colheita, estima que sua perda está em torno de 30%.

“De três anos para cá, as lavouras foram prejudicadas pela seca. O jeito é esperar e quando vier a chuva tentar adubar e garantir outros tratos para a planta”, avaliou Carlos. O estudo da Epamig concluiu que houve perdas em outras propriedades de outros municípios do Sul de Minas. Em Machado, o percentual chegou a 25%. Em São Sebastião do Paraíso, 20%. Em Lavras, 12%. Ralph Junqueira, o produtor de Carmo de Minas, sente uma dor no coração ao observar que os grãos não desenvolveram como planejado em parte de sua plantação: “O crescimento da lavoura está pequeno. O fruto no pé não está crescendo como deveria. Está chocho.”

A Epamig também fez o balanço em Patrocínio, no Alto Paranaíba, onde o percentual de grãos chochos chegou a 7,7%. É naquele município que fica a propriedade de Ricardo Bartholo: “Quem não tem irrigação fica nas mãos de São Pedro. Eu estimava colher 5 mil sacas neste ano, mas devo colher em torno de quatro mil sacas”.

Reflexos na próxima safra

Queda na produção de café neste ano é estimada em até 5,4% frente à produção de 2012. O cálculo é da Companhia Nacional de Abastecimento. A falta de chuvas também tende a reduzir a colheita de 2015

Com o sol a pino e a demora das chuvas, grãos foram prejudicados e ficaram menores que o esperado (Marcos Michelin/EM/D.A Press-31/1/14)

Com o sol a pino e a demora das chuvas, grãos foram prejudicados e ficaram menores que o esperado

Cafeicultores de diferentes regiões de Minas Gerais não têm dúvidas: a estiagem já comprometeu a safra de 2015. A falta de umidade prejudica o desenvolvimento da planta e, consequentemente, dos grãos. Para este ano, a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) já informou que a safra ficará entre 46,535 milhões e 50,151 milhões de sacas de 60 quilos. Dependendo da quantidade, significa que a colheita poderá ser 5,4% inferior à de 2012, quando foram produzidas 49,15 milhões de sacas. Vale lembrar que a produção de café é bianual – uma de ciclo alto seguida de outra de ciclo baixo.

“A falta de chuva já prejudicou a colheita de 2015. Nesta época do ano era para ocorrer a diferencial floral, quando a planta começa um novo ciclo de reprodução. Com a seca, só saberemos o tamanho da perda na florada”, lamentou Ricardo Bartholo, produtor em Patrocínio, no Alto Paranaíba, cuja perda na atual safra é estimada por ele em torno de 1 mil sacas. O fazendeiro estimava colher cinco mil sacas neste ano.

No Sul de Minas, Ralph Junqueira, produtor de café especial em Carmo de Minas, também é taxativo: “A safra de 2015 está comprometida”. E acrescenta: “Quem tem irrigação sai na frente, mas é uma coisa que não dá para fazer do dia para a noite, pois o custo é muito alto”. Vale lembrar que os cafeicultores do Sul de Minas ainda têm um custo elevado com mão de obra, pois, ao contrário dos seus colegas do Alto Paranaíba e do Triângulo Mineiro, a região é montanhosa, o que dificulta o uso de máquinas agrícolas.

Também no Sul do estado, Carlos Alexandre Miranda Botrel, dono de uma propriedade rural em Três Pontas, lamenta o fraco crescimento da lavoura: “A safra de 2015 deve ser comprometida porque a planta não está crescendo”. Para os pequenos e médios cafeicultores, uma forma de aliviar o custo com a produção é participar do projeto Educampo, do Sebrae.

“Há palestras e cursos de capacitação em mercado de café. Com a consultoria técnica e gerencial de um agrônomo, o produtor tem a ‘apontação’ de seus custos, tanto os diretos quanto os indiretos. O trabalho é na diminuição do custo e no aumento da produtividade. Um exemplo para a redução dos gastos é o manejo integrado de pragas e doenças, como também a adubação correta na época correta, baseada nas análises de solo e folha. Esses fatores contribuem para o aumento da produtividade”, explica Marcos Antônio Teixeira, analista de agronegócio do Sebrae Minas.

ÁREA REDUZIDA
Levantamento da Conab estimou a área plantada do café em 1,96 milhão de hectares, o que corresponde a um volume 3% inferior ao da safra passada. Nesse caso, é válido afirmar que o baixo preço do café, em 2013, levou muitos produtores a reduzir a área plantada.

Em relação ao total de sacas a serem colhidas, a Conab constatou que, em 2014, “a maior redução (em relação à última safra) foi observada no café arábica, que registra queda entre 2% e 8,4%. A diminuição pode ser observada devido a uma menor área plantada, reflexo do preço da cultura para o produtor, além da inversão da bienalidade em algumas regiões, como na Zona da Mata mineira, como também a adversidades climáticas, como a geada que atingiu o Paraná em 2013”.

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